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O Sistema de Crenças na Formação da Autoestima


1. APRESENTAÇÃO

Nos dias atuais estamos expostos a vários desafios no trabalho, na família, nos estudos e na sociedade. Mas atualmente um dos nossos grandes desafios tem sido amar; e amar a si mesmo tem sido provavelmente o maior deles.

Nós vivemos como se fossemos separados da Natureza, como se fossemos “entes” diferentes do Universo. Essa noção de separação traz como uma de suas consequências a falta de contato consigo mesmo. O mundo mental e da imagem em que vivemos favorece a desconexão entre mente e corpo dificultando o autoconhecimento e consequentemente o desenvolvimento da Autoestima, de uma visão positiva sobre si mesmo.

Num mundo onde a “Imagem” é a referência, onde corpos belos e torneados pelo esforço de exercícios, cirurgias e tratamentos; onde o possuir e apresentar um belo carro, um belo sorriso, um belo corpo, um belo marido e uma bela esposa se torna mais importante do que SER, cria inevitavelmente a sensação de inadequação. Pois muitos não possuem o belo sorriso, o belo corpo, o belo carro, belo marido e esposa. O auto Amor passou a ser regulado por conquistas, por apresentação ao social daquilo que posso comprar, fazer e ter, tornando-nos indivíduos estereotipados, infelizes e afastados de si mesmos.

A Autoestima fortalecida, uma visão positiva e realista de si mesmo que geram aceitação, tornou-se “artigo de luxo” na atualidade. Talvez por isso estejamos vivenciando uma epidemia de transtornos psicológicos como ansiedade e depressão, transtornos estes intimamente ligados a baixa autoestima.

Em uma era de redes sociais, internet e globalização é notório a exposição das pessoas em busca de auto aceitação e afirmação. Contudo, nem sempre isso se confirma, o que pode afetar negativamente a saúde mental dos usuários de vários aplicativos com o Facebook e Instagram. Um artigo publicado no site Tecnologia IG, afirma que estudo com jovens realizado pelo “Royal Society for Public Health (RSPH) denominado Status of Mind, pesquisou o efeito das redes sociais na saúde mental dos usuários. Na pesquisa foi identificado que o Instagram é a plataforma

que mais causa transtornos em seus usuários, tendo sido identificado um nível maior de ansiedade, depressão, insônia e insatisfação contra a própria imagem.”²

Diante de tantos fatores, cabe a reflexão sobre o tema para que possamos tomar consciência do mundo em que vivemos, bem como do nosso mundo interno e das nossas crenças, promovendo assim a possibilidade de possuirmos uma boa autoestima, pautada em aceitação e construção de uma humanidade mais justa e amorosa.

Para um melhor entendimento, neste artigo os termos Autoestima, Auto amor, Auto Conceito positivo, Visão de si mesmo positiva/realista são sinônimos, pois observa-se que vários autores referem-se a conceitos idênticos com nomenclatura diferenciada, mas possuindo o mesmo significado em interpretação dos mesmos.

2. DEFINIÇÃO DE AUTOESTIMA OU AUTO AMOR

Existem várias definições na literatura atual sobre a Autoestima, vejamos algumas definições:

Walter Riso, psicólogo especialista em Terapia Cognitivo Comportamental (2012, pg.42) afirma que “Amar a si mesmo é considerar-se digno”.

Para Autora Brenné Brown (2013), um sentimento de amor próprio significa viver plenamente, cultivando a coragem, compaixão e vínculos saudáveis, se reconhecendo vulnerável, e com suas imperfeições, sua coragem e seu valor, sendo merecedor de amor e aceitação.

Amar a si mesmo é a mais pura Aceitação, aceitar quem se é, aceitar o corpo, os pensamentos, as escolhas e ser capaz de se perdoar e manter a capacidade de prosseguir. Aceitar nossos possíveis defeitos, ou aquilo que não gostamos, nos cuidar e compreender.

Ao nos amar verdadeiramente, torna-se mais fácil amar aos outros, pois teríamos a consciência de todos somos imperfeitos, então, não podemos julgar, nem segregar. Para o autor Kristin Neff (2017), professor do departamento de psicologia da Universidade do Texas (EUA), em seu artigo publicado no Blog “ O Lugar.org”, devemos parar de perseguir a autoestima e desenvolver a autocompaixão. Para ele, a autoestima pode significar se supervalorizar, trazendo um conceito de ser “especial”, o que pode trazer um processo de comparação social e desvalorizar os outros. Para ele desenvolver a autocompaixão é a melhor forma para não partirmos para os excessos da autoestima, já que através da autocompaixão paramos de nos comparar e de comparar os outros, de buscar a perfeição e passamos no aceitar mais plenamente, aceitando nossas imperfeições, como disse Brenné Brown (2013). Para Walter Riso (2008) é importante não confundir autoestima com narcisismo, evitar os excessos da autoestima e ser verdadeiro sobre os aspectos da personalidade, justamente para evitar o pensamento de superioridade.

3. OS PILARES DA AUTOESTIMA E SUA ORGANIZAÇÃO DE CRENÇAS

Para Walter Riso (2012), a nossa auto estima possui quatro pilares essenciais, que para ele, se não há equilíbrio entre estes pilares, toda nossa autoestima pode estar comprometida:

  • Autoconceito, o que pensamos sobre nós mesmos, sobre nosso caráter e quem somos.

  • Autoimagem, qual a nossa opinião sobre nosso corpo e sobre nossa aparência física.

  • Auto reforço, o quanto premiamos e nos gratificamos.

  • Autoeficácia, o quanto acreditamos e confiamos em nossa capacidade em realizar atividades e conquistas na vida.

A visão de si mesmo, ou auto conceito (Riso,2012) se refere ao que você pensa de si, é como se fosse uma avaliação de nós mesmos, que fazemos das próprias qualidades e dos próprios defeitos. São as nossas crenças sobre nós. Geralmente, a visão de nós mesmos foi “organizada” pelo nosso ambiente familiar e pelas influências em nossa infância, como professores, parentes, amigos. A visão de si mesmo pode ser distorcida do real, baseado em ideias e experiências pouco positivas da infância, como o Bullyng. Jeffrey E. Young (pg. 23.2008), afirma que os esquemas (ou crenças centrais / profundas) inicia-se na infância ou na adolescência, como representações do ambiente da criança baseada na realidade. Ou seja, se a criança se desenvolve em um ambiente mais harmônico, onde não há eventos e situações humilhantes e excludentes, onde os adultos ou até mesmo outras crianças não reforçam negativamente os aspectos da personalidade infantil, como por exemplo: evitam xingamentos e humilhações pelas diferenças de comportamento e interesses, a criança pode desenvolver uma visão de si mesmo mais positiva. Mas se ela cresce ouvido coisas do tipo: “ você é incapaz”, “somente pessoas estúpidas fazem isso”, é bem provável que a visão que ela tenha de si mesma seja pouco positiva criando assim, crenças limitantes sobre si.

A nossa Auto Imagem (Riso, 2012) também foi organizada da mesma maneira que a Visão de si mesmo. A diferença que os aspectos corporais e estéticos é que são levados em consideração. Uma criança que é exposta a humilhações e escárnio devido a alguma parte do seu corpo, como por exemplo: tamanho das orelhas, cor de pele, estatura e peso, provavelmente se tornará um adulto insatisfeito e inseguro com seu corpo, desenvolvendo uma crença que não será amado ou aceito por causa disso.

O Auto Reforço (Riso, 2012) está intimamente ligado a crença do merecimento. O indivíduo que se auto reforça positivamente geralmente acredita que merece o “prêmio”, a conquista. Acredita e confia na capacidade de produzir bons resultados nas atividades as quais se dedica. Além disso, se permite gozar mais a vida como forma de reconhecimento pelo esforço e dedicação pelas atividades cotidianas.

Auto Eficácia ou Autoconfiança (Riso,2012) devem estar presente em todos os momentos, desde da vida pessoal até a vida do trabalho. Para André e Lelord (2004), a autoconfiança é transmitida tanto pelo exemplo quanto pelo discurso, tendo a família e o meio social fator importante na formação da autoconfiança. Sentir-se confiante está diretamente relacionado com a percepção da sua capacidade, é pensar que possui todos os recursos necessários para lidar com os desafios do dia-a-dia. Se não temos confiança em nós mesmos, estamos duvidando de nossa capacidade e, provavelmente temos uma tendência maior a fracassar em nossos intentos, já que não se acredita capaz de resolvê-los.

A vida sempre vai nos apresentar vários desafios e as nossas experiências podem influenciar a nossa percepção de nós mesmos, inclusive, criar crenças pouco positivas sobre si mesmo, como por exemplo, um término de relacionamento, a não aprovação em um concurso público podem criar crenças do tipo “ não sirvo para ser amada” e “não tenho capacidade para passar, sou pouco inteligente”, dentre outras. Por isso é importante se auto conhecer e compreender as crenças sobre si mesmo, quem você é e suas reais potencialidades.

Mas como é criada a auto imagem? Para Jeffrey E. Young (2008) nossa visão de si mesmo está intimamente relacionada aos reforços positivos ou negativos que recebemos, bem como nossas experiências vividas em nossa infância e adolescência. Sistemas de comparação e competição que geram conceitos de sucesso e fracasso também podem influenciar nossa criação de auto imagem negativa ou positiva. A família e o meio social interfere diretamente no processo de desenvolvimento da nossa autoestima. Young (2008) afirma que os esquemas desenvolvidos mais cedo e os mais fortes, geralmente se originam na família nuclear. Alguns esquemas ou crenças podem ser desadaptativas e disfuncionais, o que pode levar o indivíduo a organizar uma baixa autoestima. Elaine Sheehan (2005) chega a afirmar que o nosso autoconceito parece formar-se e desenvolver-se de fora para dentro, principalmente nos primeiros anos de nossa vida, onde somos extremamente influenciados pelos que os demais pensam de nós, o que pode desvirtuar a percepção que temos a nosso respeito. Uma baixa autoestima possui consequências, algumas veremos a seguir.

4.BAIXA AUTOESTIMA E ALGUMAS CONSEQUÊNCIAS

Aaron T. Beck, o maior nome da Terapia Cognitivo Comportamental no mundo, apresentou uma contextualização cognitiva da depressão (Wright. et al, 2008) na qual os sintomas estavam relacionados a uma forma de pensar negativamente em três domínios: sobre si mesmo, sobre o mundo e sobre o futuro, o que posteriormente seria conhecido como Tríade Cognitiva. Baseado neste conceito, nota-se a necessidade de identificar a qualidade da Visão de si mesmo como sendo fator fundamental que o indivíduo possa obter uma vida satisfatória em várias áreas de sua vida, bem como identificar a visão e as crenças de si mesmo pode ser determinante para tratar processos depressivos e outros transtornos. Em seu livro “Depressão Causas e Tratamento” (2011) em um relato de teste de Autoconceito, foi observado que pacientes deprimidos tendem a se desqualificar em relação a outras pessoas, podendo ser interpretada até mesmo como uma forma de agressividade dirigida a si mesmo. A Visão negativa de si mesmo pode inclusive acarretar comportamentos de esquiva em relação a pessoas e situações, pois o indivíduo pode ter a visão, a crença de que não é bom o suficiente, não é bonito ou atraentes, nem inteligente o suficiente. Na terapia cognitiva, é afirmado que a visão negativa de si mesmo é uma forma distorcida de ver a si mesmo, baseado em crenças e até mesmo experiências de vida isoladas, que por ter alto conteúdo emocional acabam por fixar a crença negativa sobre si mesmo experimentada em um evento,como por exemplo: não passei nessa prova, não sou inteligente nem bom o suficiente, logo em todas as provas irei mal. Geralmente, visão negativa de si mesmo está associada a auto rejeição. Há uma tendência em nos vermos de forma inferior e nos criticamos e reprovamos por isso.

Além da depressão, a baixa autoestima está intimamente ligada a ao transtorno de ansiedade social. O Dr Bernard Rangé & Cols. (2011) expõe que a autoestima equilibrada tem função de diminuir os sintomas de ansiedade social, já que o indivíduo sente-se mais seguro em apresentar-se ao meio e fica menos vulnerável as críticas e rejeições sociais. Uma pessoa com baixa autoestima, geralmente sente-se insegura e teme pelo julgamento e pela rejeição do outro. Sendo assim, pode apresentar sintomas de Ansiedade Social, o que causa em muitos casos ao afastamento do mesmo do convívio com outras pessoas, acarretando prejuízos a vida social e afetiva do mesmo.

Para Walter Riso (2012) a visão negativa de si mesmo é um dos principais fatores para o surgimento de transtornos psicológicos, como ansiedade, depressão, inseguranças, dificuldade de relacionamentos e tantos outros.

O autor Phillip L.Rice (2014), no livro Manual para o Tratamento Cognitivo Comportamental dos Transtornos Psicológicos da atualidade (Caballo,org. 2014), no capítulo que se refere ao enfrentamento do estresse, afirma que quanto maior a crença na Auto Eficácia, geralmente há um menor nível de estresse, pois se o indivíduo acredita na sua capacidade de resolver problemas e desafios, a tendência do mesmo acumular estados de estresse reduz significativamente. A reação que o indivíduo tem aos problemas cotidianos e desafios está diretamente associada a este pilar da Autoestima. Ou seja, se a crença que o indivíduo possui sobre sua Auto Eficácia é limitada, o mesmo pode não concluir tarefas por não se achar capaz, bem como evitar desafios, acarretando para o mesmo razoável prejuízo social e profissional, reduzindo suas chances de prosperidade.

Mas como podemos identificar que estamos tendo uma visão negativa sobre nós mesmos? E como saber se tenho uma boa autoestima? Para Walter Riso (2008) pessoas com baixa autoestima geralmente tem a sensação de se conhecer mal, falam de si de uma forma sobretudo neutra, descrevem-se de maneira mais moderada, imprecisa, incerta e mediana e possuem um discurso sobre si mesma às vezes contraditório. Muitas vezes tem dificuldade em reconhecer os méritos bem como aceitar elogios. Denotam uma tendência a comparações com outras pessoas, entre outros sintomas.

Já pessoas com uma boa Autoestima (Riso, 2012), demonstram possuir relacionamentos mais saudáveis e sem muitos apegos. Possuem mais emoções positivas, tornam-se mais independentes e autônomas, com mais segurança para tomada de decisões. Geralmente apresentam comportamento mais persistente e seguro, possuem também uma visão coerente sobre seus comportamentos e caráter.

5. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Refletir sobre nossas crenças a respeito de nós mesmos, nossa capacidade e nosso merecimento tornou-se pedra basilar nos processos terapêuticos e de autoconhecimento. Fortalecer a autoestima, buscar a auto aceitação, tem sido a chave para superarmos grandes desafios pessoais e existenciais. Ser você mesmo e aceitar-se nessa sociedade, pode ser considerado um ato de rebeldia, onde muitas pessoas com uma boa autoestima são confundidas com arrogantes e pouco "humildes". Aprendemos desde cedo a reconhecer o outro, fazer pelo outro, e menos para si mesmo. Ou aprendemos o excesso do auto amor, e nos tornamos narcísicos. Até para nossa autoestima vale a premissa do Zen do Caminho do Meio. O equilíbrio deve balizar nossa busca em ter uma boa autoestima, sem criar falsas ideias positivas sobre si mesmo, nem negativas, primando pelo bom senso e compaixão. O mundo hoje oferece vários recursos para esta busca, a Terapia Cognitivo Comportamental, é um dos grandes caminhos que levam a uma mudança saudável na Visão de Si Mesmo, melhorando em todos os aspectos nossa autoestima.

Pessoas que se amam mais, amam mais os outros. Desenvolver a compaixão e aceitação por si mesmo também reflete nos outros ao redor. A compaixão nos torna mais próximos da nossa Humanidade, da nossa certeza de sermos aprendizes e escritores da nossa própria vida. O mundo hoje (e sempre) precisa de Amor. Que o amor possa começar em nós para que o mundo possa sentí-lo também.

Zaionara Gomes

Psicóloga - CRP 1090/ES

*Artigo resumido para publicação em blog.

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